terça-feira, fevereiro 07, 2006

Ao Poeta

Ao meu lado um corpo que lê cada rosto, ele não existe, ele não olha, ele sente e vive intensamente dentro de mim. Deseja encontrar-se a ele próprio mas sempre que tenta entra na sua própria teia de palavras.
É poeta e não o sabe, é alma que voa pelas geladas e frias memórias, é sabedor do seu próprio destino. Algo me diz que o seu olhar transmite a dor perdida de um adeus que não alcançou.
As suas veias transbordam de sangue quente do qual bebe todas as noites saciando-lhe a sede seca do pecado.
Sozinho está no seu canto em cima de um degrau onde a sabedoria está à espreita. Escreve não olhando à volta. Não pode. Não consegue. Os olhares ferem-lhe a alma. Dentro de si uma ferida aberta, alguém o matou, alguém o atormenta. Utiliza os pensamentos como arma contra o ódio, utiliza as suas mãos para acariciar fortemente o corpo que se encontra todos as noites em seu quarto.
Agora olha à volta e procura um olhar que o acolha em seus braços, os seus olhos enchem-se de lágrimas mas não as consegue derramar. Somente no silêncio do seu quarto é que poderá deixar cair aquele corpo estranho, somente no silêncio é que poderá encontrar-se a ele próprio e partir para onde a esperança o aguarda.
Sara

*Texto escrito há quase dois anos.

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