segunda-feira, agosto 28, 2006

L de Pecado

Fotografei o teu rosto e persigo o teu cheiro por entre essas vidas que passam

Piso o chão de pedra que construiste para nós

E na tentativa forçada de te escrever estas palavras pinto as mãos com a tinta da caneta

Esperas-me agora numa qualquer esquina em Lisboa


há uma resposta que quer o teu sabor

que o conhece de outras vidas

que o reconhece

numa cidade inventada por nós e por alguém e por uma fotografia incandescente que invade a memória

que não é memória porque é um relatório presente

que se escreve a todo o instante e se inscreve em mim ou em ti


Queimas-me o coração e invades-me o espaço que só a mim me pertence

Encontro-te o olhar

nessa esquina que nos pertence

Acendes um cigarro e no meio do fumo que se enche no teu peito cansado

procuras um instante, um momento, um conforto

Digo-te: "não me procures mais..."


olho para o lado para um homem que passa que sorri que se aproxima

toca no meu ombro e diz que não devo preocupar-me que aquela afirmação não o é de facto que escutava a conversa por acaso que não me preocupe

agradeço dou-lhe um cigarro e procuro-te de novo

olho-te

olho-te de novo

entendo todos os teus pensamentos e sinto um aperto que não consigo localizar

prefiro assim


Ofereceste-me um sorriso e por entre esse sorriso vejo-te a alma

Tiro-te o poder e dou-te o silêncio

Estendes-me a mão e tocas-me no rosto

Baixo os olhos não permitindo a tua entrada

E mais uma vez, nesse momento em que o sino da igreja toca ao fundo, quebras a minha frieza e ergues o meu olhar


devagar como sempre deve ser

toco o teu rosto

tremo um pouco ao passar nos nos teus lábios

consigo um sorriso

e digo-te ao ouvido que não deves preocupar-te

não agora

fecha os olhos


Sequei os lábios ao ver-te tremer

Apertei o coraçao ao senti-lo disparar com a força com que me tocavas

Sussuras-me palavras silenciosas, por entre os gritos que me atormentam

Fecho os olhos e sinto-te vigiar-me


sinto-te

sinto-te de novo

ouço tudo o que está dentro de ti

pego na tua mão

abro-a

beijo-te

espero que abras os olhos em silêncio


Não abri o meu olhar enquanto me tocavas

Fiz de conta que não entendia

Trouxeste de volta esse cheiro a pecado

Queria dizer-te mais uma vez: "Não te quero..."

E porquê esse tão angustiado desejo?

Virei-te as costas na esperança que me deixasses fugir

Agarras-me o braço

Abres-me os olhos

E contemplas o teu mundo através de um simples corpo


Agora, escrevo-te em verso e mancho estas páginas enquanto ainda me esperas naquela esquina onde acendi o último cigarro.


23 Agosto 2006


Sara Almeida com M. Tiago Paixão



*Versão original do texto anterior, escrito em parceria com o M. Tiago Paixão.

2 comentários:

m. tiago paixão disse...

obrigado por me deixares entrar aqui, neste teu mundo, neste texto contigo.
*

TheyDontSleepAnymore disse...

Ah! agora sim. Continuem :)