Fotografei o teu rosto e persigo o teu cheiro por entre essas vidas que passam
Piso o chão de pedra que construiste para nós
E na tentativa forçada de te escrever estas palavras pinto as mãos com a tinta da caneta
Esperas-me agora numa qualquer esquina em Lisboa
há uma resposta que quer o teu sabor
que o conhece de outras vidas
que o reconhece
numa cidade inventada por nós e por alguém e por uma fotografia incandescente que invade a memória
que não é memória porque é um relatório presente
que se escreve a todo o instante e se inscreve em mim ou em ti
Queimas-me o coração e invades-me o espaço que só a mim me pertence
Encontro-te o olhar
nessa esquina que nos pertence
Acendes um cigarro e no meio do fumo que se enche no teu peito cansado
procuras um instante, um momento, um conforto
Digo-te: "não me procures mais..."
olho para o lado para um homem que passa que sorri que se aproxima
toca no meu ombro e diz que não devo preocupar-me que aquela afirmação não o é de facto que escutava a conversa por acaso que não me preocupe
agradeço dou-lhe um cigarro e procuro-te de novo
olho-te
olho-te de novo
entendo todos os teus pensamentos e sinto um aperto que não consigo localizar
prefiro assim
Ofereceste-me um sorriso e por entre esse sorriso vejo-te a alma
Tiro-te o poder e dou-te o silêncio
Estendes-me a mão e tocas-me no rosto
Baixo os olhos não permitindo a tua entrada
E mais uma vez, nesse momento em que o sino da igreja toca ao fundo, quebras a minha frieza e ergues o meu olhar
devagar como sempre deve ser
toco o teu rosto
tremo um pouco ao passar nos nos teus lábios
consigo um sorriso
e digo-te ao ouvido que não deves preocupar-te
não agora
fecha os olhos
Sequei os lábios ao ver-te tremer
Apertei o coraçao ao senti-lo disparar com a força com que me tocavas
Sussuras-me palavras silenciosas, por entre os gritos que me atormentam
Fecho os olhos e sinto-te vigiar-me
sinto-te
sinto-te de novo
ouço tudo o que está dentro de ti
pego na tua mão
abro-a
beijo-te
espero que abras os olhos em silêncio
Não abri o meu olhar enquanto me tocavas
Fiz de conta que não entendia
Trouxeste de volta esse cheiro a pecado
Queria dizer-te mais uma vez: "Não te quero..."
E porquê esse tão angustiado desejo?
Virei-te as costas na esperança que me deixasses fugir
Agarras-me o braço
Abres-me os olhos
E contemplas o teu mundo através de um simples corpo
Agora, escrevo-te em verso e mancho estas páginas enquanto ainda me esperas naquela esquina onde acendi o último cigarro.
23 Agosto 2006
Sara Almeida com M. Tiago Paixão
*Versão original do texto anterior, escrito em parceria com o M. Tiago Paixão.
2 comentários:
obrigado por me deixares entrar aqui, neste teu mundo, neste texto contigo.
*
Ah! agora sim. Continuem :)
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